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Contratos de compra e venda de commodities agrícolas devem prever de forma precisa os critérios de apuração dos valores de pagamento, liquidação e indenização

Em julgamento recente, o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”), no Agravo Inter nos Embargos de Declaração no Recurso Especial n. 1491537/MT, reconheceu como ilíquidos contratos de compra e venda para entrega de soja cuja fixação do preço se deu com base na cotação da commodity na Bolsa de Valores de Chicago.

 

No caso em questão, as partes celebraram contratos de compra e venda para entrega de aproximadamente 120 milhões de quilos de soja e  ajustaram que o valor total dos grãos seria apurado, em data futura, conforme a cotação da Bolsa de Valores de Chicago, de forma que se a cotação na data ajustada fosse inferior ao valor por saca calculado à época do pagamento antecipado, a vendedora deveria entregar as sacas de soja correspondentes para compensar a diferença de preços; se a cotação fosse superior, a vendedora receberia o pagamento complementar pela valorização da soja.

 

A discussão se concentrou na análise de liquidez dos contratos para fins de execução. Isso, porque restou ajustado entre as partes o prazo de 25/10/2008 para que a vendedora fixasse o preço das commodities com base na cotação da Bolsa de Chicago. Todavia, embora tenha efetuado a entrega da soja contratada, a vendedora se absteve de fixar o valor da mercadoria. Por tal razão, em 29/10/2008, a compradora indicou a fixação conforme cotação do dia 27/10/2008 (primeiro dia útil subsequente à data do vencimento), no valor de U$267,7852, totalizando a quantia de US$ 32.193.991,06. Ou seja, haveria uma diferença de US$ 11.982.733,36 pagos a maior pela compradora, sem que ocorresse a entrega de sacas de soja adicionais pela vendedora. Em razão disso, a compradora moveu a execução desse valor.

 

Diante do impasse, por 3 votos a favor e 2 votos de divergência, o STJ decidiu pela iliquidez dos contratos, sob o fundamento de que nenhuma das partes havia apontado a data de cotação da commodity no prazo contratualmente acordado.

 

A decisão não nos parece a melhor para o enfrentamento da questão e para a segurança jurídica da matéria, principalmente no setor do agronegócio. Nos filiamos ao embasamento do Min. Antônio Carlos Ferreira, em seu voto de divergência e que foi acompanhado pelo Min. Marco Buzzi, no sentido de que os contratos são perfeitamente líquidos e exigíveis, eis que possuem todas as informações necessárias para cálculo do valor da dívida, e, para alcançar a quantidade de produto a ser entregue em complementação ao negócio, bastou a realização de mero cálculo aritmético, utilizando-se parâmetros estipulados nos próprios contratos. Há de se concordar, ainda, com o registro de que, se a devedora porventura entendesse pelo descabimento da cotação do dia 27/10/2008, caberia a ela apontar excesso de execução, o qual, mesmo se porventura verificado, não retiraria a liquidez dos títulos e seria apreciada pelo juízo de primeira instância.

 

Da breve análise acima, levando-se em consideração a rotina contratual do agronegócio, suas práticas e costumes específicos, bem como a constante utilização de Bolsas para indexação de valores em contratos de compra e venda de commodities, são oportunos alguns apontamos sobre o caso em questão, principalmente em razão de sua grande repercussão nesse setor.

 

Inicialmente, é importante destacar que o acórdão não considerou ilíquidos os contratos tão somente pela previsão de apuração do valor da commodity com base em cotação futura da Bolsa de Chicago. Como mencionado pelo Min. Antônio Carlos Ferreira, a própria legislação prevê a possibilidade de contratos de compra e venda estabelecerem a fixação do preço pela taxa de mercado ou em bolsa (art. 486 do CC), ou, ainda, em função de índices ou parâmetros (art. 487 do CC), desde que com objetiva determinação do dia, do lugar e da forma de apuração.

 

A partir da leitura integral do acórdão, fica claro que a conclusão pela iliquidez decorreu de as partes não terem indicado o dia a ser considerado para apuração do preço da soja contratada no prazo contratualmente estabelecido para tanto, o que culminou na conclusão de que, uma vez não obedecidos os critérios contratuais para definição de preço, não seria possível aferir a liquidez necessária para o processo executivo.

 

Observa-se que o critério de apuração de preço de commodity por si só não influenciou o convencimento da Corte Superior pela iliquidez contratual. O fato é um alento para o agronegócio em razão recorrente vinculação de preço das commodities a cotações com flutuações diárias, sendo comum que os contratos rotineiros utilizados no agro disponham de formas futuras de apuração e indexadas em cotações para a formação de preços.

 

Ainda assim, não se pode desconsiderar os fatos pontuados pelo STJ para decidir pela iliquidez contratual e, portanto, as empresas devem ser diligentes no gerenciamento de seus contratos e observar sempre as condições necessárias para aferimento das informações relevantes, incluindo a formação de preço e cálculo de valores de liquidação em caso de inadimplemento (cláusula washout).

 

É por esta razão que os contratantes devem estabelecer da forma mais clara, objetiva e detalhada possível, as métricas de apuração de valores de pagamento, assim como para liquidação de valores de indenização em caso de inadimplemento parcial ou total, para que o título seja dotado de liquidez e, assim, seja considerado título executivo apto para instruir execução, sem a necessidade de prévia demanda de conhecimento para formação posterior de título judicial.

 

Antônio Geraldo Pimentel Filho, sócio do SMP Advogados.

 

Mariana Batista Rabelo, associada de SMP Advogados.

 

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