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Acórdão 1873/2024 do TCU: no regime de contratação integrada, o construtor está obrigado a executar as obras por preços licitados a partir de anteprojetos defeituosos?

O Tribunal de Contas da União, no Acórdão 1873/2024-Plenário, decidiu que, na licitação sob o regime de contratação integrada, não haveria possibilidade de aditivos em decorrência de variações de quantidades e de serviços apurados como resultado imprecisões nos projetos. O TCU declarou que, nesses casos, “cabe ao construtor o risco de eventuais supressões ou acréscimos de serviços”.

 

A decisão em questão, para fundamentar sua conclusão, fez referência ao Acórdão 831/2023-Plenário, que anteriormente havia se manifestado pela impossibilidade de admitir a celebração de aditivos para sanar falhas e imprecisões em anteprojetos.

 

Uma avaliação isolada dessas decisões poderia levar à conclusão de que, sob o regime de contratação integrada, o construtor, mesmo se detectar falhas significativas nos anteprojetos licitados, ficaria obrigado a executar o contrato sem receber o necessário reequilíbrio.

 

Essa conclusão, entretanto, não seria a mais adequada para resolver a questão.

 

O anteprojeto é um documento preliminar preparado pelo órgão na fase de planejamento da licitação. Ele é o principal documento que subsidia a licitação no regime de contratação integrada.

 

O licitante vencedor, então, se obriga a elaborar os projetos básico e executivo e a executá-los.

 

Há uma diferença substancial entre o anteprojeto e o projeto:

 

  • o anteprojeto é de responsabilidade do órgão; é um documento produzido a partir de alguns levantamentos, mas sem maiores detalhamentos e estudos; o anteprojeto define o escopo da licitação, estima o orçamento e orienta a formação das propostas; e

 

  • o projeto é de responsabilidade do contratado; é um trabalho detalhado de engenharia, produzido a partir de diversos levantamentos; é um dos documentos mais importantes, apresentando um nível de precisão e dimensionamento da obra, dos serviços e dos custos.

 

Quando há variações de quantidades e serviços envolvendo o projeto, elaborado pelo construtor sob o regime de contratação integrada, não são, por regra, tolerados aditivos em razão de imprecisões desse trabalho, pois, no caso, ele foi elaborado a partir de levantamentos e soluções de engenharia apresentadas pelo próprio empreiteiro. Por isso, essa hipótese se adequa à do Acórdão 1873/2024-Plenário, pois, nesses casos, ressalvadas as exceções legais, “cabe ao construtor o risco de eventuais supressões ou acréscimos de serviços”, em razão das imprecisões do seu próprio trabalho.

 

Com relação ao anteprojeto, as falhas e imprecisões merecem um tratamento diferente.

 

O anteprojeto não é elaborado pelo construtor, mas pelo próprio órgão e deve, segundo o Tribunal de Contas da União, “oferecer aos concorrentes informações suficientes para o dimensionamento de suas soluções e o cálculo de sua proposta” (TCU. Acórdão 2980/2015).

 

Sendo verificadas inconsistências relevantes no anteprojeto elaborado pelo órgão, o construtor não poderia ser obrigado a executar as obras, com variações de quantidades e serviços, pelo preço e condições oferecidas na licitação. O risco dessas variações substanciais não foi assumido pelo construtor, que, na verdade, foi induzido a erro a partir de um escopo de anteprojeto e de levantamentos preliminares equivocados, descobertos somente na fase de elaboração do projeto.

Em situações como essas, se a escolha não for pela rescisão do contrato, sem culpa do contratado, ele teria direito, para executar os serviços, à necessária recomposição por aditivo.

 

Esse entendimento pode ser absorvido em manifestações do TCU, ao relatar que “sempre que o escopo contratual for alterado será exigida sua formalização mediante termo aditivo”, “independentemente do regime de execução contratual” (TCU. Acórdão 1977/2013-Plenário).

 

Além disso, deve-se levar em consideração a vedação ao enriquecimento sem causa da Administração Pública. Sobre isso, o TCU já expressou que “caso, por erro ou omissão no orçamento, se encontrarem subestimativas ou superestimativas relevantes nos quantitativos da planilha orçamentária, poderão ser ajustados termos aditivos para restabelecer a equação econômico-financeira da avença” (TCU. Acórdão 1977/2013-Plenário). É a solução mais justa para obras de interesse público, impedimento, assim, a lesão ao particular por falha em anteprojeto que não pode ser imputada a ele.

 

Portanto, existem situações em que as falhas em anteprojetos influenciam no preço da licitação e, dessa forma, sendo verificado que tais falhas alteram substancialmente as quantidades e serviços, não se poderia obrigar o construtor a assumir as obras sem o necessário aditivo de recomposição.

 

Diante de situações excepcionais como essas e quando se verifica que era impossível ao construtor antever as falhas, é recomendável o aditamento, se persistir o interesse na obra, para não lesar o particular. Essa conclusão também se colhe de outra manifestação do TCU, ao relatar que “se não era exigível do particular a previsão de um serviço, inclusive por falha ou omissão do anteprojeto, é possível a celebração do termo de aditamento correspondente” (TCU. AC 2591/2017-Plenário).

 

Rafael Moura, sócio de SMP Advogado

 

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